quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

estilhaços, vinhos e tapetes indianos

Quebre os copos. Eles são de cristal e foram herança de família: meu avô os recebeu de presente do meu bisavô no dia de seu casamento. Eu não me importo. Espatife-os, jogue cada um contra a parede, cada caco vai nos lembrar que um dia fomos inteiros - não um, mas inteiros, um pro outro.
Faça ainda melhor. Pegue os vinhos, das melhores safras, você bem sabe onde eles estão guardados. Garrafa por garrafa no chão. Deixa o líquido vermelho escorrer, molhar o tapete indiano, você não estará derramando sangue de ninguém. Só deixando o seu ódio escorrer sobre a tapeçaria que nós compramos na lua-de-mel, você lembra?
Era quando "eu e você" ainda significava alguma coisa. Você ficava irritada com o serviço de quarto, eu imitava o mordomo e você ria ria me afagava os cabelos e me beijava a têmpora assim com um cuidado tão bonito que me comovia. Mas isso passou.
Hoje você não tem mais nada a me oferecer exceto cacos de vidro pela sala que levamos meses pra decorar. E não quer nada de mim além do meu cartão de crédito. É uma pena, eu ainda imito o mordomo tão bem. Gaste meu dinheiro. Gaste.
Só não gaste meu tempo, logo você que me ensinou que ele vale mais do qualquer coisa. Mais do que esses cristais, esse vinho, esse tapete indiano ou todas essas pinturas caras que você me pediu pra pendurar pelo corredor. Mais do que essa adaga de ouro que corta o seu pescoço.

Um comentário: